quarta-feira, 30 de setembro de 2009

Mas vale a pena?

A prática isolada da Advocacia, nos moldes em que é exercida em comarcas pequenas, é um barril de pólvora.
Eu sei do que falo.
Eu não tenho serviço de help-desk, eu não tenho nada a separar-me de quem me procura, a não ser uma secretária; as pessoas confundem todos os dias os planos e não entendem que eu só presto serviços a quem mos solicita.
Já me riscaram o carro várias vezes, já me escreveram cartas anónimas, já me ameaçaram directamente, já o fizeram por interposta pessoa, já me insultaram em pleno Tribunal.
Nem de propósito, ainda na segunda-feira tive uma grande chatice no Tribunal, com o fulano que estava a patrocinar, que apareceu bêbado que nem uma carroça, de tal forma que dois militares da GNR, que por mero acaso se encontravam no átrio, se ofereceram para me levar ao carro; já tive medo muitas vezes; já disfarcei o medo outras tantas; já tive que me trancar dentro do carro e assistir, em pânico, a um fulano que desatou ao pontapé e ao murro à viatura, com a senhora Solicitadora, grávida de sete meses no lugar ao lado;

Depois faço umas piadas, brinco e satirizo as situações e acho que fica sempre tudo bem.

Mas hoje, quando li que tinha falecido o meu Distinto colega de Estarreja, que foi alvejado dentro do seu próprio gabinete, pelo marido duma cliente patrocinada numa acção de divórcio, vieram-me as lágrimas aos olhos.

É um perigo. E nós achamos que desgraças só acontecem aos outros.


Vale realmente a pena arriscar a própria vida, por esta profissão, pelos clientes, pelo sistema judicial?
Não, não vale.

Os meus mais sinceros sentimentos à família do Dr. João Melo Ferreira, ilustre Advogado, que faleceu no exercício da profissão e às mãos da intolerância.

5 comentários:

afectado disse...

o gajo que deu o tiro devia levar uma carga de porrada ao pontapé até morrer. é um filho da puta!

I disse...

Ontem estava numa penhora e lembrei-me dest post.... Pensei se este quiser dá-me um tiro e ninguem me safa... Enfim vamos continuando, alguém tem de fazer isto....

Já agora, e bem mais importante, parabéns pela bébé :)

Beijocas de uma leitora assídua mas silenciosa!

José Moura disse...

Rio-me com alguns comentários de advogados, sem saber o que realmente passam na pele. As vossas funções são defender os vossos clientes, sejam obrigados ou de livre vontade.
Mas a vossa profissão está a cair muito em descrédito na sociedade e aconselho vivamente a uma mudança de atitude de alguns oficiais de justiça, aludindo à moralidade e à dignidade que anda pouco em voga na sociedade portuguesa.
Os meus sentidos pesares

Eva disse...

Pensei o mesmo quando li a notícia...
Numa sociedade em que as pessoas não são ensinadas a respeitarem-se a si próprias não é fácil exigir que respeitem o que quer que seja...a vida dos outros por exemplo!
Às vezes apetece-me tanto mudar de profissão...

Perchta disse...

Sempre soube que isto era coisa para gente de coragem, ou pelo menos soube-o desde os primeiros sustos que fui apanhando... Esta tragédia serviu para reforçar a certeza de que a nossa é uma profissão de risco, mas também para agigantar a determinação de nunca ceder ao medo. Nunca foi pelo medo que calaram os advogados, nem vai ser agora.
Estamos todos de luto.